No julgamento, que começou esta manhã no Tribunal de Matosinhos, no distrito do Porto, a arguida, que está a ser julgada por tentativa de homicídio qualificado e ameaça agravada, descreveu vários episódios de discussões e troca de insultos, contando que se sentia "muito sozinha, presa em casa", e que a vítima a vigiava e não a deixava trabalhar.
Segundo a arguida, ambos conheceram-se quando ela chegou a Portugal, vinda do Brasil, e começou a trabalhar na loja da vítima, de nacionalidade chinesa, tendo começado a relação amorosa "algumas semanas depois".
De acordo com a acusação, a arguida e a vítima namoraram durante dois anos, mas mantinham uma "relação marcada por frequentes conflitos".
No dia 14 de agosto de 2024, acrescenta a acusação, no interior de casa e após um novo conflito, "a arguida insultou o seu companheiro, ameaçou-o e agrediu-o com um objeto decorativo [um papagaio de madeira]", tendo depois agarrado uma faca de cozinha com 15 centímetros de lâmina e desferindo-lhe diversos golpes (12) na parte superior do corpo.
"Eu lembro-me que peguei na faca com que tinha estado a cortar fruta e golpeei-o, ele estava de pé. Depois subi a escada e entrei para dentro do quarto, e enfiei a faca em mim. Eu estava descontrolada, não vi onde dei, só depois que li a acusação é que vi que tinham sido essas facadas todas", itiu.
E continuou: "Eu estou muito arrependida, não sou esse tipo de pessoa. Eu podia ter tirado a vida dele e a minha vida, acabado com tudo. Peço perdão, eu tive um descontrole e não vi mais nada, só queria morrer, só isso".
A mulher, que se encontra em prisão preventiva, referiu que "vivia um inferno, não tinha vida, só ficava presa no apartamento".
A arguida itiu que sentia ciúmes do companheiro, mas afirmou que ele também a controlava: "Ele não queria que eu trabalhasse, eu ficava presa no apartamento, entrei em depressão, engordei muito e ele falou mal do meu corpo, e eu respondi falando mal do dele e ele disse-me que na China matavam a mulher que dizia aquilo".
Em julgamento, a vítima não quis responder às perguntas do tribunal, mas afirmou que perdoou a arguida e que ainda quer casar com ela.
"Eu quero o. Eu quando fui visitar a família dela ao Brasil fui porque era para casar. Fui a Fátima para rezar por nós em fevereiro. Eu perdoei a minha namorada", disse.
Nas alegações finais, que ocorreram ainda na sessão desta manhã, o MP considerou que "de grosso modo os factos, quase na sua totalidade, devem ser dados como provados".
"Quanto à intenção, todos sabemos que não foram afetados órgãos vitais nem existiu perigo de vida, mas todos nós sabemos que a aferição da intenção de matar tem que ser extraída da factualidade dada como provada. As facadas são dadas pelas costas, perto dos pulmões, e o número de facadas que efetivamente acabaram por ser dadas", disse.
Para o MP, "deve a arguida ser condenada" tendo em conta "que se trata de um crime de tentativa de homicídio (...) a pena a ser aplicada terá que ser efetiva".
Do lado da defesa, foi salientado que a vítima "nunca correu perigo de vida" e que o relatório de avaliação psiquiátrica da arguida "determina uma inimputabilidade diminuída".
"Isto aconteceu no crescer de uma relação tóxica, conflituosa, alguém que não tem ninguém em Portugal, vive numa dependência emocional e financeira em relação ao ofendido e tudo isto foi o culminar de algo, algo que se perspetivava em função do crescendo da relação conflituosa", argumentou o advogado de defesa.
Segundo a defesa, a intenção da arguida "é regressar ao Brasil, e atendendo ao tempo em que a senhora já está presa, há cerca de um ano, e ao contexto em que isto aconteceu não chocaria ninguém que esta senhora fosse condenada a uma pensa suspensa".
A leitura do acórdão ficou marcada para dia 05 de junho.
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